Monthly Archives: July 2012

“Cantigas d’amigos”, de Amália Rodrigues, Natália Correia e Ary dos Santos

Um irrepetível recital de poesia medieval pela voz de uma tríade de amigos: Amália Rodrigues, Natália Correia e José Carlos Ary dos Santos. Gravado numa das soirées na casa da fadista na rua de São Bento e registado numa peça de singular beleza – com capa da autoria da pintora Maluda, que habitualmente aí se fazia presente –, o LP “Cantigas d’amigos” foi lançado em 1971. Volvidas quatro décadas sobre a publicação original, assinala-se agora a sua primeira edição em formato digital. Considerado o mais raro exemplar da discografia de Amália, este álbum é um belíssimo compêndio de Continue reading

“Martha Marcy May Marlene”, de Sean Durkin

Para a sua inaugural longa metragem, o norteamericano Sean Durkin jogou de forma terrivelmente sublime com os fantasmas das experiências coletivas traumáticas. Neste impressionante primeiro grande gesto autoral que é “Martha Marcy May Marlene”, o produtor do igualmente memorável “Afterschool” pensa os limites do ser na sua mais pungente fragmentação identitária. Numa comunidade da América rural, o realizador filma um quotidiano feito de trocas de favores, manipulação psicológica e Continue reading

“Elena”, de Andreï Zvyagintsev

Com este “Elena”, o russo Andreï Zvyagintsev – premiado com o Leão de Ouro no Festival de Veneza de 2003 pelo igualmente memorável “O regresso” –  faz uma incursão pelas desconexas relações familiares e pelos dilemas emocionais aí extremados. Elena, uma enfermeira reformada, vive um segundo casamento marcado por comprometedoras disparidades afetivas, financeiras e sociais. No seio conjugal, a mulher branda e humilde é tratada por Vladimir, o marido, com um Continue reading

“Persépolis”, de Marjane Satrapi

Portugal conheceu primeiramente “Persépolis” pela sua adaptação ao cinema. Cinco anos depois do trabalho conjunto de Marjane Satrapi com Vincent Paronnaud, que pecava por ser cinematograficamente pouco esclarecido, a Contraponto publica a obra literária que lhe deu origem – a irrepetível e singular coleção de memórias gráficas de um Irão em crucial ponto de viragem política e cultural, visto sob o olhar irrepreensivelmente atento, consciente e quase “demasiado humano” de uma criança enquanto se transforma em adolescente e, depois, em jovem adulta. “Persépolis” reúne, num singelo registo de banda desenhada monocromática, as recordações dos flagelos da Continue reading

“A motoreta”, “A grande farra” e “Adeus macho”, de Marco Ferreri


Fez desfilar no cinema a decadência da nossa civilização. Com um humor intangivelmente negro, não raras vezes sórdido e bizarro, mas sempre inteligente pelo modo como fez da imagem metáfora e mecanismo de crítica social, Marco Ferreri foi um dos Continue reading

“Tarefas infinitas”, na Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa

Revela-se-nos com um subtítulo tão misterioso e inquietante quanto a substância e o espaço que nos convida a desvendar: “quando a arte e o livro se ilimitam”. A nova mostra que o Museu da Fundação Calouste Gulbenkian apresenta ao público nesta sexta feira (e que aí estará patente até ao mês de outubro) inscreve-se como uma proposta de ensaio e reflexão sobre as inumeráveis potencialidades semânticas e dialógicas do livro enquanto objeto de arte. Partindo do seu caráter matérico, averigua-se a hipótese do homem se Continue reading

“Vergonha”, de Steve McQueen

Descortinando as tensões emocionais de um novaiorquino de sucesso, o realizador Steve McQueen apresenta nesta segunda longa metragem com a sua assinatura autoral uma magistral peça de lúbrica consciência e cuidada sensibilidade sobre as fraquezas a que a nossa condição humana amiúde se vaticina. “Vergonha” é uma articulada narrativa que expõe de forma crua e Continue reading