Com um arguto prefácio de André Gide, numa tradução fluída de Mário Dias Correia, a Casa das Letras editou recentemente num só cuidado volume duas emblemáticas obras de Antoine de Saint-Exupéry (1900 – 1944): “Voo noturno” (1931) e “Correio do sul” (1929). Acusando a influência de Gide e de Nietzsche, de Conrad e de Verne, no seu brevíssimo e poético “Voo noturno” Saint-Exupéry constrói a complexa figura do implacável Rivière, o severo diretor geral do serviço de correio aéreo em Buenos Aires, que assegura, com obsessiva disciplina, a regularidade das missões, dilacerado entre as emoções, a perda e os seus agudos sentido de liderança e de dever, quando o seu melhor piloto e radionavegador desaparecem numa tempestade. Por seu lado, “Correio do sul” foi a primeira novela de Saint-Exupéry – diz-se que escrita sobre uma tábua colocada em cima de dois barris, em pleno deserto. Uma ligação amorosa frustrada e a celebração dos feitos aventurosos e perigos enfrentados pelos pioneiros da aviação, confirmam, logo na obra de estreia, Antoine de Saint-Exupéry não apenas como um dos lendários (e trágicos) heróis franceses, mas também como uma inimitável voz literária, representativa de um sensível humanismo filosófico, nostálgico e poético.
livro “Voo noturno / Correio do sul”, de Antoine de Saint-Exupéry
Casa das Letras, 2011
Paula Pina:
Admirável enquanto documento de época, vívido de experiências e memórias autobiográficas de Antoine de Saint-Exupéry, esta é uma obra que evoca um outro tempo, de perigos e solidão, de escutas e silêncios, de distâncias e esperas, de estrelas e encantamentos. Retrato de uma era em que a aviação era homem, máquina, perícia e coragem apenas. Admirável enquanto criação literária e exercício de análise psicológica, mais do que relato de aventura ou esboço de romance, “Voo noturno” e “Correio do sul” são verdadeiros ensaios sobre grandeza e pequenez humanas. “Voar e escrever são a mesma coisa”, dizia Saint-Exupéry. E prova-o.
