A história dos filmes é também uma permanente lição sobre o fluxo ambíguo do tempo. E, nessa medida, sobre o nosso envelhecimento. Assim, voltámos a celebrar a excelência de escrita de Woody Allen graças a “Blue Jasmine”, como se ele fosse a emanação de um cinema abstrato, exterior ao próprio tempo. Subitamente, deparamos com esta crónica novaiorquina assinada por Noah Baumbach, centrada numa personagem à deriva pelo mapa das suas ilusões e desilusões, e não podemos deixar de pensar em “Manhattan”. E tanto mais quanto “Frances Ha” é também a preto e branco. Acontece que “Manhattan” já tem mais de trinta anos (estreou em 1979). Ao convocar a sua inspiração, Baumbach está a referir-se a um genuíno clássico, herdando esse sentimento – que é uma forma de narrativa – segundo o qual a grande cidade existe como um labirinto gigantesco que se explicita e, de algum modo, transfigura, nas histórias privadas de cada um dos seus habitantes. Daí que a celebração da singularidade de Frances Ha, hesitando entre pessoas e casas, tarefas e profissões, corresponda também à consagração de Greta Gerwig, atriz e coautora do argumento (com o próprio realizador). Dir-se-ia que Gerwig retoma a herança de Diane Keaton, tal como esta foi filmada por Woody Allen, do mesmo modo que Keaton tinha aprendido com Katharine Hepburn, Judy Holliday ou Shirley Maclaine. É bom saber que a família cultiva a memória.
João Lopes
17 outubro [estreia nacional]
filme “Frances Ha” [“Frances Ha”], de Noah Baumbach, com Greta Gerwig, Mickey Sumner,…
Vendetta Filmes, 2012 / 2013