“Provoke”, de Made To Break

capa made to break provoke

Curiosamente, “Made to break” é o título de um tratado sobre obsolescência editado há meia dúzia de anos por Giles Slade – que, entretanto, em “Big disconnect”, avançou para a igualmente acutilante temática da tecnologia e solidão, preparando-se para, até ao fim do ano, lançar um caucionário ensaio inspirado pelo iminente êxodo calculado em virtude das consequências do aquecimento global. Mais do que por facilitismo titular, a premência da evocação da obra de Slade no contexto da ação desta nova banda liderada por Ken Vandermark (com Tim Daisy à bateria, David Hoff em baixo elétrico e Christof Kurzmann no software lloopp) advém de, em ambos os casos, se refletir acerca de processos e arquiteturas de controlo – a que não será indiferente a explicativa nomeação e dedicação de cada tema nos seguintes termos: “1. Further (for John Cage) 2. presentation (for Buckminster Fuller) 3. of the facts. (for Marshall McLuhan)”. Vandermark (sax tenor e clarinete) situa o grupo na confluência do seu trabalho desenvolvido, por um lado, com o trio FME (com Nate McBride e Paal Nilssen-Love) e com o quarteto Frame (com Daisy, Fred Lonberg-Holm e McBride) e, por outro, com Spaceways Inc. (com McBride e Hamid Drake) e Powerhouse Sound (que, numa primeira versão, congregou Ingebrit Haker Flaten, Lasse Marhaug, McBride e Nilssen-Love e, noutra, reuniu John Herndon, Jeff Parker e McBride), identificando preocupações composicionais comuns, nomeadamente naquilo que define como “organização modular”: uma técnica que lhe permite reestruturar cada peça a partir dos seus componentes de base e que autoriza cada músico envolvido a improvisar subestruturas baseadas nos mesmos componentes – isto é, trata-se de um fundamento de permanente fluidez, como uma relação de causa e efeito entre composição e improvisação sem hierarquia rígida, que, pela sua própria natureza, altera no momento da sua execução qualquer elemento pré-determinado, “criando e solucionando problemas em tempo real”. Simultaneamente a essa estratégia de relativa liberdade e responsabilidade interpretativa num âmbito de composição espontânea eletroacústica, numa invulgar justaposição estilística que lhe é tão caraterística, Vandermark aproveita esta formação para avançar por formalidades rítmicas tangenciais àquela aguda e precisa – mas também crua e muito pouco asseada – articulação do pós-punk britânico (em bandas como Wire ou The Fall) e melódicas associáveis ao uso de escalas pentatónicas no jazz etíope (que tem explorado paralelamente com os The Ex e com o saxofonista Getatchew Mekurya), num compósito que se revela dotado de um fascinante e maduro paradoxismo.

João Santos

disco “Provoke”, de Made To Break
Clean Feed / Trem Azul, 2013

Leave a Reply

Fill in your details below or click an icon to log in:

WordPress.com Logo

You are commenting using your WordPress.com account. Log Out /  Change )

Google photo

You are commenting using your Google account. Log Out /  Change )

Twitter picture

You are commenting using your Twitter account. Log Out /  Change )

Facebook photo

You are commenting using your Facebook account. Log Out /  Change )

Connecting to %s