Situado numa inexorável posição de vanguarda e busca pela excelência das formas, o trabalho do compositor de jazz americano Ken Vandermark interpela-se aqui numa busca marcadamente erudita pelo improviso das estruturas musicais, depois de inúmeros projetos mais telúricos desenvolvidos no último par de anos, como os grupos Made To Break, DKV ou Platform 1. O The Resonance Ensemble, nascido de uma troca de ideias com Marek Winiarski – guitarrista, membro dos polacos Bajm e proprietário da crescentemente relevante editora Not Two – é um compêndio de vozes instrumentais que acrescenta dinâmica e vigor ao génio criativo de Vandermark. Entre o saxofone barítono e o clarinete, o artista representa esta assinalável frente de inovação do free jazz atual que compreende nomes como Steve Swell, Tim Daisy, Michael Zerang, Magnus Broo ou Dave Rempis, rochas basilares da expressividade desta corrente sónica, que aqui se reúnem sob a iconoclasta batuta do mais desafiante jazzman deste século. Subsiste o gosto intenso pela forma da suite musical e o método que alia a escrita prévia com a improvisação que deixa qualquer ouvinte, inusitado ou não, em constante estado de alerta mas, também, de enlevo. Este ensemble manifesta novamente a tenacidade de Vandermark ao envolver-se em obras intrincadas como o são “Head above water”, o primeiro disco – gravado em estúdio antes da presença do grupo no Chicago Jazz Festival, em 2012 – e “Feet out of the fire”, a segunda metade deste duplo CD, resultante de uma performance ao vivo, registada na Bélgica no mesmo ano. A intensidade de “Creative reconstruction company” ou “Type A” – uma sequência extenuante e vigorosa pela sua complexidade – seduzem e hipnotizam irreversivelmente. Delicada e insistente, a música envolve viciantes camadas de textura, num paradoxo que não procura palavras, mas ouvidos em sobressalto entre cadência e arritmia.
disco “Head above water, feet out of the fire”, de The Resonance Ensemble
Not Two / import. Flur, 2013