Como condensar numa história um sentimento visceral da China do presente? Jia Zhang-ke prefere não economizar, apostando em contar… quatro histórias. Não é exatamente um filme de episódios, nem corresponde a essa lógica coral que podemos simbolizar em “Magnólia” (1999), de Paul Thomas Anderson. Tudo se passa como se as quatro histórias, na distância geográfica que as separa, mas também nas formas de violência que as aproximam, correspondessem a explosões simbólicas de um tempo em que a estabilidade de qualquer lugar está ameaçada. A esse propósito, valerá a pena recordar que Jia Zhang-ke tem na sua filmografia (por certo uma das mais importantes da atual produção chinesa) esse momento emblemático que é “O mundo” (2004), drama situado num parque de diversões de Pequim que integra miniaturas de edifícios icónicos de cidades de todo o planeta. Algo de semelhante acontece em “China – Um toque de pecado”: desde a cidade de Guangzhou (grande metrópole próxima de Hong Kong e Macau) até Shanxi (zona rural no norte do país), o filme devolve-nos a China contemporânea como um cenário de dimensões instáveis, por vezes fisicamente inquietantes, quase sempre emocionalmente agressivas. Daí a lógica política do projeto, em nada estranha ao desencanto de “24 city” (2008), sobre a desenfreada construção de apartamentos em vésperas dos Jogos Olímpicos. Para Jia Zhang-ke, trata-se de perguntar até que ponto as convulsões do desenvolvimento económico estão a decompor os mais delicados laços humanos – pelo realismo do olhar perpassa uma consciência trágica do seu tempo.
João Lopes
5 dezembro [estreia nacional]
filme “China – Um toque de pecado” [“Tian zhu ding”], de Jia Zhang-ke, com Zhao Tao, Jiang Wu,…
Midas, 2013
