Estranha conjuntura: vemos e ouvimos infinitos debates sobre a “escola”, os “alunos” e os “professores”, todos eles imbuídos de uma urgência mais ou menos gritada sobre a gravidade do momento que vivemos, a necessidade de preservar os valores que nos unem, enfim, as ameaças que pairam sobre a juventude… Ao mesmo tempo, esta é uma sociedade que não sabe transformar num grande e genuíno acontecimento um filme como “O substituto”. Porquê? Porque a conjuntura se faz também de um metódico apagamento do cinema como fator social. Mais exatamente: a imagem dominante dos filmes confunde-se com os números das bilheteiras e a agitação dos efeitos especiais, não com a contundência de um objeto de cinema (agora disponível em dvd) que coloca em cena a crise docente e moral, intelectual e afetiva, de um professor que é levado a questionar a vida errática dos seus alunos, nesse processo sendo conduzido a uma introspeção que, para além da dimensão profissional, o devolve às zonas mais remotas e perturbantes da sua história pessoal. Realizador do admirável “América proibida” (1998), Tony Kaye continua a fazer filmes não alinhados, contrapondo os restos dispersos do “american dream” à América contemporânea. Daí o peso simbólico da personagem deste professor que não desiste de ensinar a possibilidade da beleza – Adrien Brody, ator de génio irregular (mas quando é que a regularidade foi genial?…), transforma-o numa das personagens mais complexas, e também mais tocantes, da história recente do cinema americano.
João Lopes
dvd “O substituto” [“Detachment”], de Tony Kaye, com Adrien Brody, Marcia Gay Harden, Christina Hendricks,…
Alambique, 2011 / 2013