Esquecemo-nos quase sempre que a nossa definição do presente começa nos modos de apropriação do passado. A cultura televisiva dominante fundamenta-se mesmo nesse esquecimento: o passado seria apenas uma coleção de datas e nomes, lugares e eventos, quer dizer, uma “reconstituição”. Daí a grande questão estética e política: nada se reconstitui, tudo é narrativa do presente (e para o presente). No novo filme de Robert Redford, o reconhecimento de tal drama condensa-se na personagem do jovem jornalista interpretado por Shia LaBeouf: ao investigar um advogado (Redford, himself) que, 30 anos antes, terá militado contra a guerra do Vietname, integrando o grupo ativista Weather Underground, ele vai começar a compreender que algo do que procura, eventualmente aquilo que poderá escrever, é indissociável da sua própria história. Redford assume-se como herdeiro direto da mais nobre tradição liberal de Hollywood e do seu enunciado nuclear: a verdade de um momento histórico só pode ser vislumbrada através das verdades parcelares, paradoxais, porventura contraditórias, dos seres que vivem (ou viveram) esse momento. É um filme com um elenco de fazer inveja a qualquer produtor que se preze: Susan Sarandon, Stanley Tucci, Richard Jenkins, Julie Christie, Nick Nolte, Anna Kendrick, Brit Marling, Terrence Howard, Brendan Gleeson, Chris Cooper… E, no entanto, não podemos deixar de o receber como um objeto literalmente fora de moda, envolvendo um desafio radical às convenções desse cinema dito de efeitos especiais que, na sua ânsia de multiplicar super-heróis, já não atende a nada de humano. Como se os temas políticos de Redford começassem, agora, na sua própria prática estética e na admirável solidão concetual que nela se exprime.
João Lopes
11 abril [estreia nacional]
filme “Regra de silêncio” [“The company you keep”], de Robert Redford, com Robert Redford, Shia LaBeouf, Susan Sarandon, Nick Nolte, Terrence Howard,…
Zon, 2012 / 2013
