“4:44, último dia na Terra”, de Abel Ferrara

Um cenário habitado por uma caoticidade de imagens. É pela experiência mediática de um boémio casal de Nova Iorque que Abel Ferrara faz figurar, neste espantoso “4:44, último dia na Terra”, as potenciais expressões da humanidade perante a inevitabilidade do fim do mundo. Sabe-se que o planeta colapsará, às 4:44 da madrugada, numa explosão de luz – e sabe-se também que, como consequência de uma tragédia ecológica (o enfraquecimento da camada de ozono), não haverá forma de escapar. Pelos interstícios das horas que o antecedem, Ferrara faz desfilar a pura existência de Cisco (Willem Dafoe) e Skye (Shanyn Leigh) na sua tentativa de resignação a este destino comum. Entre as suas rotinas, despedidas e tensões emocionais, o espetro do dispositivo medial (e mediático) interpõe-se como artifício dúplice, que ora aproxima, ora afasta uma civilização à beira de se esvanecer. Nos ecrãs, Al Gore, Dalai Lama, Nelson Mandela, gurus da filosofia zen, jornalistas, rostos familiares, anónimos, melodias e ruídos de crua beleza assolam-nos numa imagem, que tudo, no eminente fim, sintetize – a da serpente que principia a vida e a devora. Uma obra que se demarca com singular inteligência cinematográfica dos discursos apocalíticos, e que se apresenta como peça de atenta leitura da contemporaneidade.

9 agosto [estreia nacional]
filme “4:44, último dia na Terra” [“4:44 Last day on Earth”], de Abel Ferrara, com Willem Dafoe, Shanyn Leigh,…
Alambique, 2011 / 2012

 

texto no Sound + Vision

 

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