Há uma espécie de fantasma audiovisual que perpassa na nossa visão deste filme. Que é como quem diz: algo nos leva a perguntar o que motivou Alexander Payne a rodar “Nebraska” a preto e branco? A pergunta tem, por certo, uma resposta cinéfila que envolve as memórias de um cinema pós-clássico — a que pertencem, por exemplo, “A última sessão” (1971), de Peter Bogdanovich, ou “Manhattan” (1979), de Woody Allen — empenhado em celebrar e revitalizar a frondosa herança da “idade de ouro” do preto e branco. Mas pode ser também uma pergunta que tende a sugerir algum formalismo que, em boa verdade, está muito distante dos desígnios de Payne. Acontece que a aventura amarga e doce do velho (Bruce Dern) que acredita que ganhou uma lotaria por correio nos toca como exemplo de um cinema que não abandonou as matrizes da psicologia clássica e, sobretudo, sabe manter-se fiel a uma atualidade tecida de muitos desencantos. Este é, afinal, o retrato de uma América interior que, na sua vulnerabilidade, parece continuar ligada a um imaginário a preto e branco. E, por mais que isso possa parecer estranho a um espetador (des)educado nas imagens “coloridas”, tal visão envolve uma atenção às pequenas convulsões do género humano que está para além de qualquer opção cromática.
João Lopes
27 fevereiro [estreia nacional]
filme “Nebraska” [“Nebraska”], de Alexander Payne, com Bruce Dern, Will Forte,…
Zon, 2013 / 2014