Heinz Holliger revisita Robert Schumann através de uma utópica reinvenção dos seus “Cello romances”, as composições do pianista oitocentista que, 37 anos depois da morte, foram queimados pela sua mulher, Clara Schumann, a pedido de Johannes Brahms: da obliteração das cinzas, Holliger recolhe o espetro anímico de um Schumann vasquejante e perto da morte, recuperando aqui as pautas que constituem “Romancendres”, por si concebidas no ano de 2003 (e anteriormente gravadas para a ECM no homónimo CD de 2009). O fascínio por Schumann é empolado pelo cruzamento entre composições suas e outras de Holliger que, através do seu oboé d’amore, manipula e interpreta de forma tão precisa neste trabalho comemorativo do seu 75º aniversário. Acompanhado pelo violoncelo de Anita Leuzinger e pelo piano de Anton Kernjak, o maestro helvético desconstrói a voz dessa sua recente peça para violoncelo e piano, e reencontra o encanto blasé, melancólico, inocente das composições de Schumann. No alinhamento surge ainda uma adaptação para oboé do “Intermezzo” constituinte da sonata “F-A-E” (a obra conjunta de Robert Schumann, Johannes Brahms e Albert Dietrich) e uma versão para violoncelo da “Sonate nr. 1 für pianoforte und violine in a-Moll, op. 105”. As emoções na partitura transportam-se para o romantismo prematuro que Holliger faz serpentear nas notas do oboé – o retrato que Schumann carecia, estampado no ar pela intemporalidade da música de câmara.
disco “Robert Schumann; Heinz Holliger – Aschenmusik”, de Heinz Holliger
ECM / DistriJazz, 2014
