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“12 anos escravo”, de Steve McQueen

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Na esmagadora maioria das notícias sobre “12 anos escravo”, não se refere o facto de Brad Pitt, além de ter um pequeno e significativo papel, ser também um dos produtores do filme. A omissão é sintomática de um fenómeno muito típico do nosso espaço mediático: tudo o que se desvia um pouco das categorias formatadas da “informação” é, por princípio, ignorado (por vezes intensamente recalcado). Podemos dizer que o filme de Steve McQueen se constrói, justamente, a partir de uma discussão metódica da formatação da história da escravatura. Desde logo, no plano histórico, expondo uma América não apenas ideologicamente dividida face à escravatura, mas também habitada pelos contrastes sociais de tal tensão: as cenas de Solomon Northup (Chiwetel Ejiofor) como homem livre, antes de ser raptado e enviado para o Sul, não são a figuração de uma utopia, mas sim a muito realista constatação do estado das coisas em meados do séc. XIX. Depois, através de uma elaborada reconfiguração dramática da relação senhor/escravo: com a personagem de Edwin Epps (Michael Fassbender), McQueen coloca em cena, não apenas a brutalidade da repressão, mas também o modo como a violência que Epps aplica lhe surge legitimada e, por assim dizer, naturalizada por um aparato de crenças com laços profundamente religiosos. Deparamos, enfim, com um novo patamar da revalorização realista que encontramos em muito do melhor cinema contemporâneo: a exposição dos gestos humanos surge indissociável da teia de ideias e valores que os gera, integra ou administra. Em “12 anos escravo”, a ação é sempre um pensamento em ação.

João Lopes

2 janeiro [estreia nacional]
filme “12 anos escravo” [“12 years a slave”], de Steve McQueen, com Chiwetel Ejiofor, Michael Fassbender, Lupita Nyong’o, Paul Dano, Brad Pitt,…
Zon, 2013

 

texto no Sound + Vision

 

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