“Gesualdo – Madrigals for five guitars”, de Noël Akchoté

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O espírito mantém-se impoluto, virtuoso, prodigioso, mas é encarnado por um confronto de ideias conhecedor apenas do léxico do amor. Tudo é rigorosamente celebrado e, em simultâneo, rigorosamente enigmático e revelador. Numa leitura animicamente informada pela lucidez histórica e pela personalidade evolucionista do guitarrista Noël Akchoté, traduz-se o celífero pelo telúrico num desafio tonal ao visionário “Quinto libro dei madrigal a cinque voci”, obra polifónica de 1611 do profético compositor renascentista Carlo Gesualdo (1566 / 1613), aqui depurada na personalidade cândida de cinco guitarras de tessitura metajazzística (David Grubbs, Adam Levy, Doug Wamble, Julien Desprez, para além do líder do quinteto), que lhes acrescenta tensão dramática e multirreferencialidade hologramática, decantando (i. e., retirando o canto e isolando a sua irredutível dimensão cristalina) o que de misterioso e ascético nela coabitava. Laconicamente confessional, patenteando com inexcedível rigor a exímia intimidade narrativa e afinidade emocional do orquestrador com a inefável placidez tácita destas partituras, “Gesualdo – Madrigals for five guitars” é um insigne e extemporâneo estudo de ambígua imaterialidade e apurada vocação idílica.

Bruno Bènard-Guedes

disco “Gesualdo – Madrigals for five guitars”, de Noël Akchoté
Blue Chopsticks / Flur, 2014

 

texto originalmente publicado no Jornal de Letras n.º 1150 de 29 outubro 2014

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